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quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Bagagem - Adélia Prado

žCom licença poética

Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo.  Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
— dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.
žGRANDE DESEJO


Não sou matrona, mãe dos Gracos, Cornélia,
sou mulher do povo, mãe de filhos, Adélia.
Faço comida e como.
Aos domingos bato o osso no prato pra chamar cachorro
e atiro os restos.
Quando dói, grito ai.
quando é bom, fico bruta,
as sensibilidades sem governo.
Mas tenho meus prantos,
claridades atrás do meu estômago humilde
e fortíssima voz pra cânticos de festa.
Quando escrever o livro com o meu nome
e o nome que eu vou pôr nele, vou com ele a uma igreja,
a uma lápide, a um descampado,
para chorar, chorar, e chorar,
requintada e esquisita como uma dama.
žSensorial


Obturação, é da amarela que eu ponho.
Pimenta e cravo,
mastigo à boca nua e me regalo.
Amor, tem que falar meu bem,
me dar caixa de música de presente,
conhecer vários tons pra uma palavra só.
Espírito, se for de Deus, eu adoro,
se for de homem, eu testo
com meus seis instrumentos.
Fico gostando ou perdôo.
Procuro sol, porque sou bicho de corpo.
Sombra terei depois, a mais fria.
žORFANDADE
"Meu Deus,
me dê cinco anos.
Me dê um pé de fedegoso com formiga preta,
me dê um Natal e sua véspera,
o ressonar das pessoas no quartinho.
Me dê a negrinha Fia pra eu brincar,
me dê uma noite pra eu dormir com minha mÆe.
Me dê minha mãe, alegria sã e medo remediável,
me dá a mão, me cura de ser grande.
Ó meu Deus, meu pai,
meu pai."
žResumo

Gerou os filhos, os netos,

deu à casa o ar de sua graça

e vai morrer de câncer.

O modo como pousa a cabeça para um retrato

é o da que, afinal, aceitou ser dispensável.

Espera, sem uivos, a campa, a tampa, a inscrição:

1906-1970

SAUDADE DOS SEUS, LEONORA.
ž
LEITURA
žEra um quintal ensombrado, murado alto de pedras.
žAs macieiras tinham maçãs temporãs, a casca vermelha
žde escuríssimo vinho, o gosto caprichado das coisas
žfora do seu tempo desejadas.
žAo longo do muro eram talhas de barro.
žEu comia maçãs, bebia a melhor água, sabendo
žque lá fora o mundo havia parado de calor.
žDepois encontrei meu pai, que me fez festa
že não estava doente e nem tinha morrido, por isso ria,
žos lábios de novo e a cara circulados de sangue,
žcaçava o que fazer pra gastar sua alegria:
žonde está meu formão, minha vara de pescar,
žcadê minha binga, meu vidro de café?
žEu sempre sonho que uma coisa gera,
žnunca nada está morto.
žO que não parece vivo, aduba.
žO que parece estático, espera.

žSaudação
Ave, Maria!
Ave, carne florescida em Jesus.
Ave, silêncio radioso,
urdidura de paciência
onde Deus fez seu amor inteligível!
žPOEMA ESQUISITO
Dói-me a cabeça aos trinta e nove anos.
Não é hábito. É rarissimamente que ela dói.
Ninguém tem culpa. Meu pai, minha mãe descansaram seus fardos,
não existe mais o modo
de eles terem seus olhos sobre mim.
Mãe, ô mãe, ô pai, meu pai. Onde estão escondidos?
É dentro de mim que eles estão.
Não fiz mausoléu pra eles, pus os dois no chão.
Nasceu lá, porque quis, um pé de saudade roxa,
que abunda nos cemitérios.
Quem plantou foi o vento, a água da chuva.
Quem vai matar é o sol.
Passou finados não fui lá, aniversário também não.
Pra quê, se pra chorar qualquer lugar me cabe?
É de tanto lembrá-los que eu não vou.
Ôôôô pai
Ôôôô mãe
Dentro de mim eles respondem
tenazes e duros
porque o zelo do espírito é sem meiguices:
Ôôôôi fia.
žAntes do nome
Não me importa a palavra , esta corriqueira.
Quero é o esplêndido caos de onde emerge a sintaxe,
os sítios escuros onde nasce o "de", o "aliás",
o "o", o "porém" e o "que", esta incompreensível
muleta que me apoia.
Quem entender a linguagem entende Deus
cujo Filho é Verbo. Morre quem entender.
A palavra é disfarce de uma coisa mais grave, surda-muda,
foi inventada para ser calada.
Em momentos de graça, infrequentíssimos,
se poderá apanhá-la: um peixe vivo com a mão.
Puro susto e terror. 
žO DIA DA IRA
  As coisas tristíssimas,
o
rolomag, o teste de Cooper,
a mole carne tremente entre as coxas,
vão desaparecer quando soar a trombeta.
Levanaremos como deuses,
com a beleza das coisas que nunca pecaram,
como árvores, como pedras,
exatos e dignos de amor.
Quando o anjo
passaro,
o furacão ardente do seu vôo
vai secar as feridas,
as secreções desviadas dos seus vasos
e as lágrimas.
As cidades restarão silenciosas,
ssem um veículo:
apenas os pés de seus habitantes
reunidos na praça, à espera de seus nome
žAgora, ó josé
  teu destino, ó José,
a esta hora da tarde,
se encostar na parede,
as mãos para trás.
Teu paletó abotoado
de outro frio te guarda,
enfeita com três botões
tua dura paciência.
A mulher que tens,
tão histérica,tão histórica, desanima.
Mas, ó José, o que fazes?
Passeias no quarteirão
o teu passeio maneiro e olhas assim e pensas,
o modo de olhar tão pálido.
Por improvável não conta
o que tu sentes, José?
O que te salva da vida
é a vida mesmo, ó José,
e o que sobre ela está escrito
a rogo de tua fé:
"No meio do caminho tinha uma pedra",
"Tu és pedra e sobre esta pedra", a pedra, ó José, a pedra.
Resiste, ó José.
Deita, José,
dorme com tua mulher,
gira a
aldraba de ferro pesadíssima.
O reino do céu é semelhante a um homem
como você, José.
žImpressionista
 


Uma ocasião,
meu pai pintou a casa toda
de alaranjado brilhante.
Por muito tempo moramos numa casa,
como ele mesmo dizia,
constantemente amanhecendo.  

žBUCÓLICA NOSTÁLGICA 
  Ao entardecer no mato, a casa entre
bananeiras, pés de manjericão e cravo-santo,
aparece dourada. Dentro dela, agachados,
na porta da rua, sentados no fogão, ou aí mesmo,
rápidos como se fossem ao Êxodo, comem
feijão com arroz, taioba,
ora-pro-nobis,
muitas vezes abóbora.
Depois, café na canequinha e pito.
O que um homem precisa pra falar,
entre enxada e sono: Louvado seja Deus!
žPra comer depois
  Na minha cidade, nos domingos de tarde,
as pessoas se põem na sombra com faca e laranjas.
Tomam a fresca e riem do rapaz de bicicleta,
a campainha desatada, o aro enfeitado de laranjas:
Eh bobagem!’
Daqui a muito progresso
tecno-ilógico,
quando for impossível detectar o domingo
pelo sumo das laranjas no ar e bicicletas,
em meu país de memória e sentimento,
basta fechar os olhos:
é domingo, é domingo, é domingo. 
žEXPLICAÇÃO DE POESIA SEM NINGUÉM PEDIR
Um trem-de-ferro é uma coisa mecânica,
mas atravessa a noite, a madrugada, o dia,
atravessou minha vida,
virou só sentimento.
žGuia
  A poesia me salvará.
Falo constrangida, porque só Jesus 
Cristo é o Salvador, conforme escreveu
um homem - sem coação alguma -
atrás de um crucifixo que trouxe de lembrança
de Congonhas do Campo.
No entanto, repito, a poesia me salvará.
Por ela entendo a paixão
que Ele teve por nós, morrendo na cruz.
Ela me salvará, porque o roxo
das flores debruçado na cerca
perdoa a moça do seu feio corpo.
Nela, a Virgem Maria e os santos consentem
no meu caminho apócrifo de entender a palavra
pelo seu reverso, captar a mensagem
pelo arauto, conforme sejam suas mãos e olhos.
Ela me salvará. Não falo aos quatro ventos,
porque temo os doutores, a excomunhão
e o escândalo dos fracos. A Deus não temo.
Que outra coisa ela é senão Sua Face atingida
da brutalidade das coisas?
žAnunciação ao Poeta
  Ave, ávido.
Ave, fome incansável e boca enorme,
come.
Da parte do Altíssimo te concedo
que não descansarás e tudo te ferirá de morte:
o lixo, a catedral e a forma das mãos.
Ave, cheio de dor.
žSÍTIO
Igreja é o melhor lugar.
Lá o gado de Deus pára para beber água,
rela um no outro os chifres
e espreita seus cheiros
que eu reconheço e gosto,
a modo de um cachorro.
É  minha raça, estou
em casa como no meu quarto.
Igreja é a casamata, de nós.
Tudo lá fica seguro e doce,
tudo é ombro a ombro buscando a porta estreita.
Lá as coisas dilacerantes sentam-se
lado a lado deste humaníssimo fato
que é fazer flores de papel
e nos admirarmos como tudo é incrível.
Está cheia de sinais, palavra,
cofre e chave, nave e teto aspergidos
 contra vento e loucura.
Lá me guardo, lá me espreito
a lâmpada que me espreita, adoro
o que me subjuga a nuca como um boi.
Lá sou corajoso
e canto com meu lábio rachado:
glória no mais alto dos céus
a Deus que de fato é espírito
e não tem corpo, mas tem
o olho no meio de um triângulo
donde vê todas as coisas,
até pensamentos futuros.
Lugar sagrado, eletricidade
 que eu passeio sem medo.
Se eu piscar,
o amor de Deus me mata".
žCANÇÃO DE JOANA d'ARC
A chama do meu amor faz arder minhas vestes.
É uma canção tão bonita o crepitar
que minha mãe se consola,
meu pai me entende sem perguntas
e o rei fica tão surpreendido
que decide em meu favor
uma revisão das leis.
žOs Lugares Comuns
  Quando o homem que ia casar comigo
chegou a primeira vez na minha casa,
eu estava saindo do banheiro, devastada
de
angelismo e carência. Mesmo assim,
ele me olhou com olhos admirados
e segurou minha mão mais que
um tempo normal a pessoas
acabando de se conhecer.
Nunca mencionou o fato.
Até hoje me ama com amor
de vagarezas, súbitos chegares.
Quando eu sei que ele vem,
eu fecho a porta para a grata
supresa.
Vou abri-la como o fazem as noivas
e as amantes. Seu nome é:
Salvador do meu corpo.
žENREDO PARA UM TEMA
  Ele me amava, mas não tinha dote,
só os cabelos pretíssimos e um beleza
de príncipe de estórias encantadas.
Não tem importância, falou a meu pai,
se é só por isto, espere.
Foi-se com uma bandeira
e ajuntou ouro pra me comprar três vezes.
Na volta me achou casada com D. Cristóvão.
Estimo que sejam felizes, disse.
O melhor do amor é sua memória, disse meu pai.
Demoraste tanto, que...disse D. Cristóvão.
Só eu não disse nada,
nem antes, nem depois.

žBRIGA NO BECO
  Encontrei meu marido às três horas da tarde
com uma loura oxidada.
Tomavam guaraná e riam, os desavergonhados.
Ataquei-os por trás com mãos e palavras
que nunca suspeitei conhecer.
Voaram três dentes e gritei, esmurrei-os e gritei,
gritei meu urro, a torrente de impropérios.
Ajuntou gente, escureceu o sol,
a poeira adensou como cortina.
Ele me pegava nos braços, nas pernas, na cintura,
sem me reter, peixe-piranha, bicho pior,
fêmea-ofendida,
uivava.
Gritei, gritei, gritei, até a cratera exaurir-se.
Quando não pude mais fiquei rígida,
as mãos na garganta dele, nós dois petrificados,
eu sem tocar o chão. Quando abri os olhos,
as mulheres abriam alas, me tocando, me pedindo graças.
Desde então faço milagres.
žJANELA
  Janela, palavra linda.
Janela é o bater das asas da borboleta amarela.
Abre pra fora as duas folhas de madeira à-toa pintada,
janela jeca, de azul.
Eu pulo você pra dentro e pra fora, monto a cavalo em você,
meu pé esbarra no chão.
Janela sobre o mundo aberta, por onde vi
o casamento da Anita esperando neném, a mãe
do Pedro Cisterna urinando na chuva, por onde vi
meu bem chegar de bicicleta e dizer a meu pai:
minhas intenções com sua filha são as melhores possíveis.
Ô janela com tramela, brincadeira de ladrão,
clarabóia na minha alma,
olho no meu coração
.
ž

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

COMENTÁRIO DE OBRAS - UESB

O comentário das obras literárias e dos filmes para o vestibular da UESB-2012 começa hoje às 13:30h.

(77) 30888661
(77) 88014114

terça-feira, 1 de novembro de 2011

REVISÃO UFBA

Confirmadas as aulas de resolução de provas de Português da UFBA. Começam na quinta (03/11). Custo: R$20,00 para quem não é aluno e R$10,00 para quem faz um de nossos cursos.Reserve já a sua vaga!

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Acertamos o tema do ENEM!

Ter sorte é importante. Mas sem um pouco de competência não teríamos conseguido antecipar (sem fraude, que fique bem claro!)o tema do enem 2011. Parabéns pra nós. Parabéns pra nossos alunos. E conectem-se conosco, pois os palpites só começaram.

Obs. veja no blog as nossas postagens que antecipavam a necessidade de estudar o tema Redes Sociais para fazer uma boa prova.

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Cinco pontos sobre redes sociais na Internet


Por Raquel Recuero (*)
Nos últimos anos, assistimos a um crescimento espantoso das chamadas tecnologias de comunicação. Essas tecnologias tornaram-se mais rápidas, mais populares e mais instrumentalizadas no cotidiano de milhares de pessoas em todo o mundo. Passaram, assim, a fazer parte de um conjunto de práticas sociais que permeia o século XXI, construindo sentidos e modificando comportamentos.
Dois elementos são marcantes nesta mudança estrutural: o primeiro deles é o foco na participação, que principalmente através da Internet, torna-se o carro chefe da popularização dessas tecnologias. O segundo é que essa participação dá-se em uma escala global, nunca antes proporcionada por nenhum meio de comunicação a indivíduos. É nesse âmbito que o foco nas chamadas "redes sociais" retorna à discussão. Nesse contexto, observamos novas práticas sociais que emergem da apropriação desses sistemas, primeiro com a popularização das salas de bate-papo, depois com ferramentas como fóruns, blogs, fotologs e, finalmente, através dos chamados sites de redes sociais.
Foi o surgimento desses sites (a partir de 1997, com o Six Degrees) e sua posterior popularização (a partir de 2002, com o Friendster) que banalizou o uso do termo "rede social" para os grupos formados na Internet. Sites de redes sociais são caracterizados principalmente pela exposição pública da rede de conexões de um indivíduo, que mostra aos demais quem são seus amigos e a quem está conectado; e pela construção de representações das pessoas ali envolvidas. (Esta última, enquanto fator necessário para que a primeira possa emergir.) Assim, as redes sociais na Internet não podem ser confundidas com a ferramenta que as suporta; são, por si, expressões de grupos sociais, de pessoas e instituições que estão permanentemente interconectadas pelas novas tecnologias de comunicação e informação. São constituídas pelas representações das pessoas (os perfis no Orkut, as páginas pessoais e etc.) e as conexões que existem entre essas representações ("amigos" no Orkut, links em um blog, etc.).
Muito se tem falado a respeito dessas redes. Tanto sobre o seu potencial de colaboração quanto dos elementos egocêntricos que rodam sua publicização. Nos meus próximos artigos, vou desenvolver o que chamarei de alguns "pontos", sistematizações e argumentações obtidas, principalmente, através de pesquisas empíricas, a respeito do fenômeno, onde pretendo mostrar como essas redes podem ser constituídas (e o são, muitas vezes) enquanto espaços de ações relevantes para a sociedade. É com o objetivo de sistematizar alguns conhecimentos sobre redes sociais na Internet que foco esse texto.
Ponto 1: Redes Sociais na Internet são sobre pessoas e não são desconectadas das redes offline
A referência às redes sociais no contexto do ciberespaço pode ser uma novidade. Mas os grupos sociais que surgem nesses sistemas não o são necessariamente. Como o trabalho de muitos pesquisadores tem mostrado (notadamente o trabalho das pesquisadoras americanas Danah Boyd e Nicole Ellison, por exemplo), esses sites tratam de complexificar relações já existentes, mais do que simplesmente proporcionar o surgimento de grupos novos. As pessoas estão utilizando essas ferramentas para reencontrar amigos, auxiliar a manter relações sociais e ampliar suas redes. Aqui, portanto, temos um primeiro ponto: As redes sociais na Internet vão expressar um conjunto de relações já existentes e vão manter um espaço contínuo de conexão para os atores sociais. Dentro dessa perspectiva, essas redes vão se constituir sim em espaços de trocas e interação e é esse o primeiro uso dessas ferramentas: conectar pessoas.
É essa conexão que contém grande parte do apelo dessas ferramentas. Não apenas pelo valor da sociabilidade mas, também, pelo valor do lazer. Assim, são comuns os casos de pessoas que encontram amigos de infância com quem não mantinham contato há anos através do Orkut, ou famílias que se reúnem com parentes desaparecidos, descobertos através dessas ferramentas. Estudos desenvolvidos a respeito do uso do Facebook nos Estados Unidos, por exemplo, demonstraram que muitos um dos principais valores da ferramenta era permitir que os jovens mantivessem contato com suas redes sociais locais quando se mudavam para estudar em outra cidade. Ou seja, a Internet auxiliava na forma de manter as conexões sociais das pessoas, como forma de amplificar o alcance dos contatos.
Assim, as ferramentas de comunicação mediada pelo computador não criam redes sociais desconectadas, distantes do mundo concreto de um determinado indivíduo. Ao contrário, expressam e complexificam as relações sociais já existentes, a partir do momento em que parte dos espaços sociais vai desaparecendo do mundo contemporâneo.
Ponto 2: Redes sociais na Internet são construídas pela apropriação
Outro ponto importante que precisamos levar em conta nessa discussão é que essas redes sociais, como espaços de "expressão do eu", são também construídas através da comunicação. São unicamente as trocas entre os indivíduos que vão estabelecer as conexões que depois serão mantidas pelo sistema. Como espaços sociais, as redes ultrapassam o objetivo da ferramenta. Elas vão além daquilo que foi pensado como possível. Assim, essas tecnologias têm seus significados reconstruídos pelos grupos sociais, que fornecem, através de suas práticas, sentidos diferentes para cada ferramenta.
Ora, as comunidades do Orkut, originalmente criadas como espaço de discussão, passaram a ser utilizadas por muitas pessoas como meros "crachás", demonstrando filiações e gostos e auxiliando na construção de um perfil. Assim, as comunidades foram apropriadas pelos grupos sociais brasileiros e reconstruídas com novos sentidos. O Twitter, outra ferramenta popular, por exemplo, também superou o foco na pergunta "o que você está fazendo" e se tornou um espaço de circulação de informações de todos os tipos, inclusive, noticiosas. Chamo esses usos de apropriação.
Essas apropriações não são determinadas pelas ferramentas e são quase sempre criativas e diferentes para grupos sociais diferentes. Essas apropriações vão construir redes sociais diferentes, conexões diferentes em cada espaço. Isso significa que os sites de redes sociais não são utilizados do mesmo modo. Grupos diferentes criam sentidos diferentes para as ferramentas.
Assim, há ferramentas de nicho, como o MySpace, que tem ganho popularidade por conta do foco na música, que tem sido apropriado por diversas bandas e grupos musicais como ferramenta de divulgação de seu trabalho e contato com fãs. Isso significa, também, que as redes sociais que são expressas nesses sites não são todas iguais. Mais ainda, dentro do mesmo sistema, podemos ter diferentes apropriações. Há, por exemplo, muitos grupos utilizando o Orkut como ferramenta de expressão. Mas também há grupos que se organizam e trocam informações através da ferramenta. Assim, a apropriação não pode ser generalizada ou generalizadora. O sentido é construído na ação das pessoas e em sua interação.
Ponto 3: Redes sociais na Internet  são circuladoras de informação
Redes sociais são expressões de grupos na Internet. Não são, como discutimos iguais e servem a valores e interesses diferentes na Rede. Mas elas possuem elementos em comum, como o uso de sites que vão facilitar e complexificar essas conexões, tornando-as quase permanentes. Por conta dessas conexões, as redes sociais na Internet tornam-se caminho de fluxos de informação, que são repassados entre os atores que fazem parte de uma mesma rede e que vão atingindo redes cada vez mais distantes. Redes sociais, portanto, circulam informação dentro dos processos comunicativos que as constituem. Essas informações podem ser de todos os tipos, desde pessoais até notícias com relevância para determinados grupos. O que acontece é que, dentro dessas redes, os atores filtram as informações a que têm acesso, escolhendo repassar aquelas que julgam ter maior relevância.
Em uma recente pesquisa sobre o Twitter, por exemplo, descobrimos que há um grande potencial informativo na ferramenta e que muitos usuários realmente estão empenhados em repassar informações relevantes e de qualidade. Iniciativas informativas semelhantes já foram observadas em blogs e fóruns. A constituição de espaços onde as informações são rapidamente repassadas pode ser positiva como potencialmente informadora. Barack Obama utilizou ostensivamente a capacidade informativa das redes sociais em sua campanha. Utilizando boa parte dessas ferramentas como espaço de contato com seus eleitores, Obama divulgou idéias, comícios e jingles, protagonizando aquela que foi chamada "a primeira campanha eleitoral 2.0" da História. Mas Obama e sua equipe não construíram a campanha sozinhos. Quem propagou as informações, considerando-as relevante e necessárias foram suas conexões, ou seja, as demais pessoas que faziam parte de sua rede social. Foi o fato da campanha ter compreendido a lógica dessa rede e ter feito, do candidato, parte dela, que possibilitou que fossem tão bem sucedidos no processo.
É, portanto, fato que a mediação que proporciona que as pessoas estejam conectadas faz dessas redes um canal natural para a difusão e o espalhamento de informações consideradas relevantes. Redes sociais na Internet, assim, potencializam a capacidade de fazer com que informações diversas cheguem a indivíduos potencialmente distantes dos fatos.
Ponto 4: Redes sociais na Internet são espaços de conversação
O que faz as redes sociais na Internet estruturas que propagam, filtram e repassam as informações, também faz delas espaços de discussão e conversação. E é como espaço de discussão, ou ainda, de participação, que essas ferramentas estão cada vez mais estabelecidas. É porque as tecnologias proporcionam que as pessoas falem que também permitem que elas mantenham contato, estabeleçam canais alternativos de comunicação e possam discutir fatos que influenciam as suas vidas.
Há alguns anos, percebi a dimensão desse poder quando alguns jovens, indignados com um caso de maus-tratos aos animais no Rio Grande do Sul organizaram, através de um debate acontecido no Orkut, todo um movimento pelos direitos dos animais. Através da mediação da Internet, esse grupo construiu espaços de discussão, blogs e listas, organizou eventos, palestras e passeatas e conseguiu que muitas pessoas apoiassem sua causa e ampliassem a discussão para outras plataformas. Assim, matérias sobre o grupo saíram em vários jornais e programas de televisão, trazendo e trazendo o debate também para outras partes da sociedade.
Ponto 5: Redes sociais na Internet são potenciais espaços de mobilização
Se as redes sociais, por conta das conexões, proporcionaram formas de difusão de informações muito maiores, repartindo o poder antes característico dos meios de comunicação de massa entre os diversos atores, é também verdade que ampliaram o potencial da colaboração. Dissemos, no início deste artigo, que essas redes são constituídas de atores que vão conectando-se entre si. Essas conexões podem ser estabelecidas também por interesses comuns. Assim, como essas redes proporcionam que outras pessoas sejam contactadas e que interesses comuns sejam divididos, é apenas natural que proporcionem, também, mobiliazação social.
Várias dessas ações, nascidas prioritariamente nesses espaços já tiveram repercussão na mídia e em espaços nacionais e internacionais. As redes sociais, como espaços de discussão e de circulação de informações, proporcionam que idéias surjam, sejam debatidas e construam um potencial de ação para os atores sociais.  Os exemplos estão por todos os lados: Recentemente, a Assembléia Legislativa de São Paulo foi palco de um grande protesto contra a proposta de lei do Senador Azeredo (substitutivo ao PLS 76/2000, PLS 137/2000 e PLC 89/2003), organizado e difundido como Movimento "Mega Não" principalmente através das redes sociais na Internet. O ato, que contou com a participação de políticos, ONGs e internautas passou também a ser espalhado pelos estados brasileiros.
Nas redes sociais na Internet, portanto, está um potencial mobilizador decorrente da possibilidade de encontrar pessoas com interesses comuns e pensamentos semelhantes. Um potencial gerado a partir da construção de um novo espaço de debate e de canais alternativos de comunicação e informação.
*Raquel Recuero é doutora em Comunicação, professora e pesquisadora da Universidade Católica de Pelotas e do CNPq e consultora em mídias sociais. Mantém o blog Social Media.